A casa fica na Áustria, portanto o líder nazista era, na verdade, austríaco, e não alemão. Mas claro que isso pouco importa, é apenas uma informação. A questão é que não é nada agradável para a cidade ter essa casa e a fama de ser o “berço do mal”.
Veja em vídeo:
Em uma casa situada na cidade de Braunau am Inn, fronteira entre dois países, a Áustria e a Alemanha, nasceu Adolf Hitler, líder do partido nazista e protagonista de um dos maiores genocídios da história da humanidade, o holocaustro, onde morreram milhões de judeus assassinados por serem quem eram. Com 17 mil habitantes, Braunau am Inn simplesmente não consegue se livrar da maldição de ser o local de nascimento de Hitler. Outras cidades têm um passado nazista bem mais pesado, como Nurembergue, onde eram celebrados os grandes encontros do partido nazista. Mas, hoje em dia, quando alguém pensa em Nurembergue, pensa logo no seu famoso mercado de Natal e no tradicional pão de mel. No caso de Braunau am Inn, todos pensam em Hitler. Quando ele ainda não tinha apenas três anos de idade, seu pai Alois, um funcionário da alfândega, foi promovido e a família mudou-se para Passau, na Baviera, do outro lado da fronteira. Em 1898, eles se mudaram novamente, desta vez para Leonding, no distrito de Linz. E é Linz que ele sempre considerou sua cidade natal e que quis mais tarde, quando estava no poder, se tornar a cidade mais bonita do Danúbio e o contrapeso cultural de Viena, que tanto detestava.
E agora um documentário extraordinário investiga o amargo debate sobre o destino do prédio nesta cidade.
O fato de Hitler não parecer ter se importado muito com Braunau am Inn, suas casas eram seu apartamento em Munique, sua segunda residência no Berghof e a chancelaria (incluindo o bunker), não conseguiu salvar a cidade da maldição de ser chamada de “o berço do mal”, onde o líder nazista nasceu, e de ter que carregar esse fardo desde o final da Segunda Guerra Mundial, quando todos esconderam seu retrato do outrora amado Führer.
O fato é que o prédio em que Hitler nasceu, no número 15 da Salzburger Vorstadt, permaneceu praticamente inalterado ao longo do tempo, causando, além de considerável constrangimento e perigoso interesse neonazista, um amargo debate sobre o que fazer com ele, tanto na cidade quanto na Áustria como um todo. O cineasta austríaco Günter Schwaiger dedicou-se a acompanhar essa polêmica, de uma perspectiva pessoal, moral e comprometida muito interessante, no documentário chamado “Quem tem medo da cidade de Hitler“, com o subtítulo “Uma casa e o passado dentro de nós“.
O filme aborda a espinhosa questão da casa ao pesquisar as opiniões dos habitantes de Braunau, um lugar que, como lamenta um deles, já tem marrom em seu nome (Braun, como em Braunhemden, as camisas marrons usadas pela Sturmabteilung paramilitar do Partido Nazista, a SA, para não mencionar Eva Braun). Desde o início, fica claro que grande parte da sociedade austríaca não está nada feliz em ter Hitler como compatriota; eles preferem Sissi e Mozart. Isso se resume na piada de que os austríacos conseguiram convencer o mundo de que Hitler era alemão e Beethoven era austríaco. Um entrevistado em Viena até sugere mudar um pouco a fronteira para que Braunau fique do lado alemão.
E o que fazer com a casa, que está fechada desde 2016, é a questão central e o destino da propriedade se torna uma metáfora para a consciência e a memória dos habitantes de Braunau e, por extensão, de todos os austríacos. Schwaiger tem moradores, historiadores e autoridades falando, pessoas de diferentes ideologias, com opiniões diferentes. Alguns consideram a casa “um estigma” para a cidade, outros ridicularizam tanta controvérsia sobre “uma casa em que nada aconteceu, nenhum crime foi cometido e nenhuma ordem foi emitida“. E é verdade, é apenas um imóvel, mas sabemos que os seres humanos levam esse tipo de coisa, que verdadeiramente não deveria ser levado a serio, mas os seres humanos tem esse perfil e essa importância existe e é levada a sério. É o que nos diferencia dos animais: o fato de ter nosso pensamento sempre presente e interpretando as coisas.
E muita coisa acontece nesta cidade, assim como em outras do mundo, por causa desse perfil dos seres humanos, afinal não pensamos igual, e, infelizmente, muitos veneram Hitler e seus atos. Certa vez um morador de Braunau jogou um balde de água em jovens em uniformes da SA que vieram comemorar o 90º aniversário de Hitler. “Se eles não vierem aqui, irão para outro lugar“, comenta outro. As opiniões da centenária ex-vice-prefeita, Lea Olczak, uma mulher corajosa com um pai morto em Mauthausen e que é tão semelhante em aparência à jornalista Gitta Sereny, que entrevistou criminosos de guerra nazistas, são dignas de nota. “Eu senti medo sob os nazistas? Eu poderia escrever um livro sobre o medo.“
Entre as seções mais impactantes deste documentário está a filmagem da câmera escondida do que acontece do lado de fora da casa durante um dia inteiro de outro aniversário de Hitler, onde um neonazista chegando de Berlim coloca uma coroa de flores “ao nosso abençoado Adolf” e discute com um vizinho que não gosta da homenagem, enquanto o neonazista apela à liberdade de expressão. Essa liberdade de expressão é terrível nestes casos, mas nós aqui do canal somos sempre favoráveis a ela, pois quando se proíbe a liberdade de expressão, alguem vai decidir por nós. Hitler certamente não gostava da liberdade de expressão. Espero que você compreenda o que queremos dizer.
Voltando ao documentário, também são filmadas as comoventes reflexões sobre o Holocausto por algumas pessoas com deficiência mental da instituição comunitária Lebenshilfe, e também as cenas filmadas em ambientes fechados quando a equipe de filmagem têm acesso excepcional.
“Fiquei surpreso com sua simplicidade e normalidade“, diz o cineasta sobre sua visita ao interior da casa vazia. “Eu imaginei, como todo mundo, um lugar sinistro. Eu esperava algo escuro, úmido, com uma aura negativa, e o que encontrei foi o oposto; um espaço aberto, com muitas janelas. Nada que pudesse induzir uma sensação sombria ou podre. A simbologia está na cabeça.” Na verdade, Hitler mal morava na casa. Supõe-se, diz Schwaiger, que ele nasceu em uma pequena sala no segundo andar. Quando a família partiu, a propriedade tornou-se uma casa alugada, abrigou uma escola e um restaurante e teve outros usos até que Martin Bormann, o poderoso secretário particular de Hitler, a comprou e deu a ele. Os nazistas instalaram uma sala onde Hitler supostamente nasceu para fomentar o mito, com móveis que nunca estiveram lá, e na casa e seus arredores o aniversário foi comemorado de forma animada, com uma profusão de suásticas, como pode ser visto em imagens da época recuperadas para o documentário.
A ideia do mal intrínseco da casa, contemplando-a como uma casa de horrores ou algo saído do filme O Exorcista, com a criança de Hitler no último andar virando a cabeça 360 graus como o Regan possuído, é perigosa, reflete Schwaiger, porque reforça a ideia do mal individual de Hitler. Acreditar que ele era como a criança no filme O presságio em detrimento da responsabilidade coletiva pelos crimes do Terceiro Reich.
Schwaiger, 58, que vem de Neumarkt am Wallersee, a 19 Km de Salzburgo e 40 de Braunau, e cujo irmão (que aparece no filme) mora na cidade natal de Hitler, adverte contra a afirmação generalizada e tranquilizadora (e também falsa) de que a Áustria foi a primeira vítima dos nazistas, que o nazismo veio de fora e que Hitler era pouco menos que um estrangeiro e sua casa, uma Área 51, quando seis milhões de austríacos eram membros do partido nazista, proporcionalmente mais do que os alemães, e também forneceram alguns dos piores criminosos do regime, entre eles Kaltenbrunner, Globocnik e Frank Stangl, o comandante de Treblinka.
“O fato de a casa de Hitler ser vista como uma mansão sombria do mal libera você de ter que fazer uma reflexão séria e daí as propostas para mantê-la fechada, demoli-la ou reformá-la, modificando a fachada, até que se torne irreconhecível,”diz ele. Para o diretor, que faz seus próprios pais falarem com notável nostalgia sobre os velhos tempos sob o nazismo e o quanto era “divertido” ser membro da Juventude Hitlerista, a casa precisa de outro tipo de exorcismo que não seja o de Merrin e Karras: deve se tornar um lugar de memória, e nas palavras do diretor “que mostre como toda a nação estava envolvida até a medula no nazismo, que os nazistas não eram um grupo maligno que trouxe o mal a Áustria, mas sim um movimento que nasceu ali.” E ele também enfatiza: “A casa deve nos dar a oportunidade de meditar sobre nosso passado como país de carrascos, para explicar como o mal pode crescer a partir da normalidade. Devemos nos confrontar com a verdade e a culpa.“
E acreditamos que está certo, isto tudo que ele diz é o mesmo motivo de estudar a história em vez de escondê-la: para que o ser humano não repita, no futuro, os mesmos erros.
Infelizmente, como mostra o documentário, as autoridades austríacas, que adquiriram a casa em 2016, hoje estando sob o controle do Ministério do Interior, não estão de bom humor. Eles chegaram ao ponto de querer remover a pedra da paz, o monólito da pedreira de Mauthausen, instalado em 1989 na frente da casa com a inscrição: “Pela paz, liberdade e democracia. Nunca mais fascismo. Milhões de mortos são um aviso“. Esta placa e a atitude das autoridades, pelos motivos que já citamos anteriormente sobre os seres humanos, obviamente provocam ali protestos generalizados.
A decisão final sobre a casa, por enquanto, como Schwaiger adverte que as próximas eleições na Áustria marcadas para 29 de setembro de 2024 podem produzir um chanceler que faça com que tudo possa acontecer, a decisão sobre a casa foi neutralizá-la: modificar a fachada para devolvê-la à sua aparência do século 18 e convertê-la em uma delegacia de polícia. As obras deveriam começar em 2020 e terminar em 2022, mas começaram timidamente em outubro passado e agora estão paralisadas. A casa permanece no limbo. Dito isto, o orçamento para a obra disparou de 5 milhões para 22 milhões de euros. O novo cronograma afirma que a reforma será concluída em 2025 e a delegacia estará operacional em 2026. Os escombros produzidos pela reforma serão guardados e descartados discretamente, para que não sejam convertidos em memória e relíquias neonazistas. O filme pretendia documentar o processo, mas com os atrasos teve que modificar sua abordagem à medida que avançava. “Seria um documentário clássico, mas fui forçado a mudá-lo e levá-lo a um terreno mais emocional“, diz Schwaiger.
Para o cineasta, simplesmente mudar a fachada é uma metáfora exata para a relação da Áustria com seu passado nazista. Como disse Thomas Bernhard: “somos uma nação de teatros, mudando por fora para que tudo permaneça o mesmo por dentro.” E ele acha a ideia da delegacia escandalosa. Não apenas por causa da participação ativa das polícias alemã e austríaca no Holocausto e da ligação da casa de Hitler a uma força armada e uniformizada. “Apenas um quartel do exército seria uma decisão pior“, diz ele. Mas porque, de acordo com um documento cuja descoberta é mostrada no filme, os nazistas e o próprio Hitler queriam dar a ela um uso administrativo oficial. “É uma terrível ironia da história que a decisão das autoridades democráticas austríacas em relação à casa esteja tão alinhada com os desejos de Hitler“, diz ele.
Cinematograficamente, levar o documentário para reflexões morais, pois o diretor diz que “não posso ser apenas um observador“, fez com que o diretor usasse recursos artísticos capazes de traduzir a paisagem interior em imagens, com metáforas como a floresta ou a estrada, tentando reproduzir espaços oníricos ou estados mentais. “É o filme mais difícil que já fiz na minha vida“, diz Schwaiger. “A casa de Hitler é um lugar dentro de nós.“
Chegamos ao fim e respondendo a pergunta do título, dá para ver que não é uma questão fácil de ser resolvida, como poderia parecer quando você começou a ler estas linhas.
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